Poggio di Sotto

Magnífica Montalcino!

Tenho o privilégio de fazer parte desta confraria e mais uma vez me esbaldar nos abençoados elixiris de Baco, mais uma grande e inesquecível experiência com vinhos marcantes que considero, entre todos os que já provei ou tomei desta região, os melhores em seu estilo, verdadeiros bálsamos para a alma. Tem muito Brunello que gostaria de ser um Rosso Salvioni e esse Poggio di Sotto é um Brunello para o qual faltam adjetivos, pura luxúria! Vinhos de excelência, de extrema persistência na mente e na alma, como bem descreve a amiga Raquel (nossa porta voz da Confraria Saca Rolhas), é fechar os olhos e ser levado numa inebriante viagem ao passado, à cultura e  tradição de uma romântica e sedutora região, é arte e poesia em forma liquida! Enfim, deixemos que a Raquel fale desse encontro em que eu fiquei numa dúvida cruel, se fungava ou bebia e, na dúvida, lambi! rs

Mas é tudo Sangiovese!!!!!!!! Foi a primeira coisa que pensei, quando comecei a organizar as informações pré degustação da confraria.

Toscana
A região da Toscana, situada entre Firenze e Roma, foi o berço da renascença. Sua paisagem verde, recortada em vários tons, possui pequenos vales e montes que não passam de 600m de altitude. Os verões são quentes , muito ensolarados e secos, fazendo dessa paisagem uma grande pintura de cores contrastantes entre o claro e o escuro, luzes e sombras, no mais puro estilo renascentista. Os invernos frios com névoas que cobrem os pequenos vales como um véu pela manhã, transformam sua paleta em tons pastéis.

Foi nesse ambiente que a uva Sangiovese se originou. Alguns dizem que seu nome provem de “Sangue de Giove”(sangue de São João), outros de “Sangue de giogo/gioghetti”(sangue de um monte/montanha, com referências aos Apeninos). É a matéria prima dos principais vinhos da Toscana (DOCG): Chianti, Chianti Clássico, Nobile di Montepulcciano, Rosso de Montepulcciano, Rosso di Montalcino, Brunello di Montalcino, Morellino di Scansano e Carmignano. Todos eles com personalidade marcante e tão diferentes entre si. O que os diferencia é justamente o local de plantio da Sangiovese, que foi se desdobrando em vários clones. Há basicamente dois tipos da mesma uva: A Sangiovesi Grosso, maior, com a pele mais grossa e a Sangioveto, com uvas menores. E dependendo da denominação de origem, vão mudando de nome: Prugnolo Gentili em Montepulcciano, Brunello em Montalcino e Morellino em Scansano.

Tudo começou por conta de uma viagem à Toscana dos amigos e confrades Márcia e Marc, que se dispuseram a trazer umas garrafas do mítico Brunello de Montalcino Poggio di Sotto, que seriam o alvo da nossa próxima degustação. A ideia no entanto, não era conhecer vários produtores, mas sim um produtor em especial a que alguns ali já haviam sido apresentados e vez ou outra comentavam como sendo uma experiência única! Curiosidade atiçada, foram eles atrás do tão bem falado “Poggio di Sotto”. E para lhe fazer páreo, foi escolhido um Salvioni Rosso de Montalcino produzido pela Azienda Agricola Cerbaiola.

Montalcino At it´s Best

Os vinhos de Brunello em Montalcino originaram em 1870, pelas mãos da família Clemente Santi (hoje Biondi-Santi) que replantou todo seu vinhedo com a variedade Grosso, por ser mais resistente, principalmente à filoxera. Nos anos 80, ganhou interesse internacional pela qualidade, que faziam frente aos grandes vinhos Barolos do Piemonte. São vinhos classudos, que demoram 5 anos para serem colocados no mercado ( 6 anos para os reserva). Já o Rosso foi uma opção dos produtores da região, obterem um produto de qualidade, porém com mais agilidade de comercialização. Utilizando as mesmas videiras em safras não tão boas ou mesmo videiras mais jovens, e com apenas 1 ano de maturação na cave, já é possível colocar o produto no mercado. E convenhamos que a diferença de qualidade entre um Brunello e um Rosso di Montalcino, depende muito das mãos do seu produtor, já que a matéria prima é a mesma. Portanto, um Rosso bem feito, poderá ser melhor que um Brunello mal feito. Independente de quanto custou cada garrafa em questão!

E este foi naquela noite o nosso dilema: quais dos vinhos estariam mais sedutores? O Rosso ou o Brunello? Tínhamos ali um ótimo Rosso e um ótimo Brunello, ou seja , deveríamos nos desarmar de todos os paradigmas já estabelecidos e simplesmente apreciá-los. Afinal, nesse universo de bacco, o que menos importa é o julgamento e sim as sensações presentes em cada taça. No meu caso, a única coisa que vinha à mente era a paisagem da Toscana. E não era uma paisagem real, mas sim uma pintura renascentista, com seu realismo particular, revelando-se pouco a pouco como uma história remota. Os aromas facilitavam esse embarque no tempo e no espaço. Naquela paisagem bucólica, permeada de ciprestes e oliveiras, as vinhas e construções em terracota, que inspirou pintores como Leonardo da Vinci, Raffaelo Sanzio, e tantos outros. Nuances cromáticas, sabores e texturas aveludadas deixavam cada um de nós, a cada gole mais tocados e embriagados, no bom sentido, por aquela experiência vivida, que só um bom vinho é capaz de nos oferecer.

Provamos primeiro o Rosso di Montalcino Salvioni 2009 e depois partimos para o Brunello di Montalcino Poggio di Sotto 2007.

Acho que não da para dizer que um vinho é melhor que o outro. Os dois eram muito bons dentro de cada categoria. Obviamente, fiz minhas anotações e acho que a “viagem” foi longa, intensa e certamente quando a experiência é boa, fica para sempre. Foi uma estória com final feliz onde eu arriscaria até a dizer que compreendi o sorriso da Monalisa!

Deuses do Olimpo 2011

  Antes de começar a listar meus melhores de 2011 e destaques por país neste ano que passou, gostaria de compartilhar com os amigos os néctares que invadiram minha vinosfera particular e se aninharam, ainda bem, na minha taça. São vinhos de grande qualidade que me deixaram, assim como quem compartilhou essas garrafas comigo, um pouco mais felizes pois, como já dizia o mestre Saul Galvão, “vinho só existe para dar prazer” e estes cumpriram sua missão com enorme galhardia. Foi um ano de muitos vinhos mais antigos e uma seleção de vinhos de sobremesa que beiraram a perfeição em seus mais diversos estilos.

Da esquerda para a direita:

Cune Inperial Gran Reserva 1999 – ainda muito vivo e vibrante. Absolutamente sedutor assim como a companhia no dia, a Confraria das Enoladies.

Chateau Palmer 1984 – gentilmente partilhado pelo amigo César e que, na união com o prato e pessoas presentes, mostrou o real significado da harmonização perfeita. Maravilha que já comentei aqui em post recente.

Angelica Zapata Estiba Reservada 2005 – 100% Cabernet Sauvignon e um dos melhores vinhos argentinos que já tive o prazer de tomar mostrando que nesta sub-região de Mendoza o Cabernet reina. Tomado com as amigas Enoladies, foi um vinho marcante que virou a cabeça até de quem não é lá tão chegada na taça!

Poggio di Sotto Brunello di Montalcino 2006 – o vinho que mudou meu conceito e impressão sobre os famosos vinhos desta região da Toscana. Provei, este lamentavelmente não tomei, num encontro do Consorzio de Brunello e sacudiu minha estrutura sensorial como poucos fizeram neste ano que passou. Divino!

Vina Tondonia Branco 91 – sempre uma experiência única tomar estes vinhos de Rioja que são extremamente marcantes com sabores diferenciados, uma complexidade ímpar, difícil encontrar brancos velhos desta envergadura. Para os apreciadores deste estilo, imperdível e este foi tomado na companhia dos amigos da confraria Valor du Vin.

Vega Sicilia Único 1999 – meu post sobre esta lenda em minha taça é bem recente então não falo mais nada. Uma outra experiência maravilhosa  fruto do desapego e generosidade enófila do amigo Fernando. Bão demais!

Bollinger Special Cuvée – não é á toa que é conhecido como um dos melhores, se não o melhor, champagne não safrado. Um exemplo de elegância e perfeita harmonia gerando enorme prazer numa explosão de estrelas na boca! Mais um vez uma dádiva na taça compartilhada com as Enoladies que este ano tomaram belos vinhos na confraria.

Dalva Porto branco velho 1963 – este provei na Expovinis e caí de joelhos, aliás nestes vinhos de sobremesa o fiz por diversas vezes, agradecendo a Baco por este verdadeiro elixir do deuses. Uma raridade do qual tive o privilégio de trazer um quarto da garrafa de volta para loja onde 10 participantes do curso de vinhos tiveram oportunidade de bicar e se embasbacar com os aromas e sabores na taça. Inesquecível e quem for comigo na viagem a Portugal terá o prazer de também o provar.

Caratello 2001 – um Vin Santo de lamber os beiços. Este tomei, com a benção e companhia do amigo Beto Duarte, por duas vezes e me lambuzei todinho!!!

Tokaji 6 Puttonyos 2004 da Pendits – o supra sumo dos vinhos de sobremesa, um vinho soberbo que gera emoções diferenciadas e únicas tendo sido compartilhado conosco pelo amigo César.

Moscatel de Setubal, Roxo Superior 1971 – Este comprei em Portugal para o amigo Alexandre comemorar seus 40 anos em 2010. Ele celebrou com outros rótulos e guardou este até que o vinho completasse seus 40 aninhos e, em mais um exercício de generosidade enófila , o compartilhou comigo e com o Cristiano num almoço de inicio de ano memorável! Ao ser aberto encheu a sala de aromas absolutamente sedutores que se comprovaram na boca de uma forma impossível de descrever. Este só tomando para saber! Talvez meu principal vinho do ano junto com o Brunello, o Dalva, o…….deixa pra lá!

S. Leonardo Porto Tawny 20 anos – Tinha esquecido como este vinho é excepcional e a meu ver, o melhor Tawny 20 anos que já tive oportunidade de provar. Absolutamente divino e só lamentei o fato de que quando o comprei não ter tido a disponibilidade financeira de comprar uma meia dúzia. Por aqui no Brasil não sei se alguém o está trazendo, mas os amigos de Portugal podem se esbaldar com este imperdível néctar, m grande Porto e uma vinho absolutamente maravilhoso que tomado na boa companhia do Ale e Cris, acompanhados de suas bonitas e simpáticas esposas, ganhou em muito na harmonização.

          Bem, esses saõ os doze que sentam no altar de Baco, mas sempre cabe um décimo terceiro que neste ano foi muito especial pois é mais um daqueles vinhos raros que poucos conhecem.

Quo Vadis Fondillon Solera 72, um vinho raro e excepcional tomado numa degustação especial com diversos outros surpreendentes rótulos deste produtor (Francisco Gomez) de Alicante na Espanha. Juntos nessa degustação promovida na Vino & Sapore pela Vinhos do Mundo e com a presença dos amigos Didu e Walter Tommasi que, tanto quanto eu, ficaram de queixo caído! Ainda não postei nada sobre ele porque queria estudar um pouco mais sobre este estilo de vinho antes de me aventurar a falar dele, mas me faltou tempo. Com mais de dez anos de amadurecimento em barrica, no nariz parece um Jerez, pelo estilo produtivo em processo oxidativo de solera, mas na boca mostra seu caráter doce, ótima acidez mostrando um tremendo equilíbrio, uma experiência e tanto que nos marcou a todos. Maravilha!

       Semana que vem apresentarei alguns dos destaques de 2011 a começar por Brancos e Rosés marcantes independentemente de preços. Depois, os Achados de 2011 por faixas de preço ou seja, Janeiro vai ser o mês das listas que, espero, irão lhe ajudar na escolha de seus vinhos neste ano de 2012. Salute e kanimambo!

Que Vinho Era Aquele? Não Parecia mas é!

Para saciar a curiosidade dos amigos, especialmente da Brenda (rs), eis aqui o vinho que me inspirou a provocá-los com o quizz da semana passada. Concordo que talvez se estivesse no vosso lugar, teria chutado, como muitos fizeram, um Rioja antigo, quem sabe até um Tondonia  ou, quiçá,  um Pinot.  Charme, um belo vinho que me impressionou na degustação dos Douro Boys também seria candidato, mas gente, esse vinho é um Brunello di Montalcino e dos bons! Quem chegou mais perto, diria até que acertou, apesar de também ter sugerido um Rioja, foi o amigo Emilio da Portal dos Vinhos, mas ele é suspeito pois tem uma certa paternidade sobre o caldo. Poggio di Sotto Brunello di Montalcino 2006, sério candidato a melhor vinho tomado em 2011! O tal do Parker lhe deu 97 pontos e, desta feita, tendo a concordar com o dito “guru” das notas, o midas dos produtores!

Minha visita ao evento promovido pelo Consorzio di Montalcino reunindo 32 produtores ainda será alvo de um post especifico, mas este vinho, o melhor que provei na mostra, merece um destaque especial, e um post especifico pois é inebriante e me mostrou uma faceta dos Brunellos que eu desconhecia. Serviu, inclusive, para eu finalmente entender do porquê que todo mundo exaltava os Brunellos e eu nunca ter me seduzido por ele. Não que não gostasse, na maioria são ótimos vinhos, mas sempre os achei muito novo mundistas, muito densos, super extraídos e potentes, um pouco over eu diria. Estes vinhos mais comumente encontrados por aqui, descobri agora, porque os Brunellos não são lá muito a minha praia, até em função de preço, são vinhos intitulados modernistas, de maior sintonia com o mercado especialmente o americano. Talvez por isso, os poucos que havia provado não tenham feito a minha cabeça, que me perdoem os apreciadores do gênero, e esta cor na taça seja estranha para a maioria dos amigos.

O Poggio di Sotto é um produtor tradicionalista num estilo em que predomina uma elegância estruturada sem excessos, porém com enorme complexidade, tudo na medida certa sem arestas nem exageros de qualquer espécie.  Muito aromático e sedutor no nariz, na boca explode com uma riqueza de sabores difícil de descrever e, mais do que tentar entendê-lo, deixei-me levar pelas emoções que me provocou, uma verdadeira massagem na alma e no espirito. Profundamente equilibrado, médio corpo, taninos sedosos, uma acidez gulosa que chamava comida que era absolutamente desnecessária, pois o vinho em si já era uma tremenda viagem de reflexão e enorme satisfação com um final interminável. Eu, essa garrafa, uma boa musica de fundo, eventualmente uma boa companhia como minha esposa que bebe pouco, eh/eh, e mais nada! Uma verdadeira experiência hedonística á qual retornei três vezes e não sei quando poderei repetir, já que por volta dos R$750,00 (em 2014 por volta de R$1.000) não tem muitas chances de visitar minha adega pessoal. Para quem tem, eis uma despesa que vale a pena, um grande Brunello, um grande Vinho, assim mesmo, com V maiúsculo!  Divino, sublime, escolha seu adjetivo, o vinho é uma tremenda viagem pelo complexo mundo das sensações gustativas, um verdadeiro vinho de reflexão.

Seu Rosso di Montalcino também é um belo vinho, mas desse e outros comentarei em meu post da semana que vem sobre esse encontro com Brunellos e Rossos promovido pelo Consorzio no mês passado, por sinal uma das melhores degustações que tive a oportunidade de participar este ano. Uma experiência inesquecível que fiz questão de compartilhar com você, pois essa é a verdadeira essência deste blog.

Salute gente, um baccio per tutti deste mais  novo discípulo de Brunello!