Sacando a Rolha de Vinhos da Crise

A Confraria Saca Rolha se reuniu para sua 47º reunião tendo como objetivo degustar vinhos da crise! A inspiração do tema veio de uma matéria lida num site de loja nos Estados Unidos quando há alguns anos montaram uma degustação de “Recession Wines” (abaixo de USD10). Nas confrarias é natural que os patamares de preço e qualidade subam com o tempo, afinal essa é sua essência, então quando propus este tema o Uncorking-Old-Sherry-Gillrayprimeiro impacto foi surpresa, porém todos rapidamente toparam o desafio de um choque de realidade e na hora toparam, afinal há vida nos rótulos mais em conta?! Há tempos que falo disso aqui e afirmo, sem hesitação, que sim, só que o garimpo é maior. Cada um teve seus preferidos, eu também, que podem ser diferentes um dos outros, porém nossa porta voz é a amiga Raquel Santos cabendo-lhe a missão de colocar na tela e compartilhar com você o resultado de nossas aventuras pelos caminhos de Baco, então fala aí Raquel, o que você achou?

Estamos vivendo tempos difíceis e até o governo já admitiu que este ano será marcado pela crise econômica, onde a adaptação é a palavra de ordem. Saber se preparar é o primeiro passo para garantir a sobrevivência. Não importa que sacrifícios isso possa envolver, mas uma coisa é certa, se você quer se preparar para a crise de 2015/16, a primeira providência é reduzir a todo custo seu grau de endividamento.

Ninguém deixa de tomar banho porque a água está escassa nem pára de comer porque os preços dos alimentos estão pela hora da morte. Nós, amantes dos vinhos, acreditamos que esse consumo regular e cotidiano, não é uma prática supérflua e desnecessária. É um hábito que adquirimos inicialmente por puro deleite e prazer, mas com o passar do tempo e ganho de conhecimento, descobrimos que além disso, trata-se de uma bebida que complementa a boa alimentação trazendo muitos benefícios à saúde.

Em tempos de vacas magras seria prudente revisar nossos padrões de consumo de vinho sem que seja necessário eliminá-lo. Pensando nisso, a ideia de juntarmos vinhos a preços razoáveis e com qualidade, pareceu-nos uma reflexão bem proveitosa tanto para nós como para outras pessoas que evitam o seu consumo apenas pela questão do preço.

A escolha dos vinhos foi baseada na relação qualidade x preço x prazer selecionada pelo João, devendo ficar numa faixa de preços entre 50 e 70 Reais. Foram eles:

Gouguenheim Bubbles Rosé– Um espumante argentino da região de Mendoza.
Elaborado com a casta Malbec, tem uma bela tonalidade rosada. O rótulo indica a categoria Extra Brut (3 a 7g/l ), porém percebe-se um leve residual de açúcar que não chega a incomodar pois tem acidez equilibrada o que, por outro lado, evidencia uma agradável presença de frutas silvestres frescas. Preço: R$67,00.

William Fèvre Espino Pinot Noir 2012 (Chile) – A vinícola, que leva o nome do enólogo da Borgonha, já indica um estilo de vinificação tradicional francesa, porém com sotaque chileno. O Espino-Pinot Noir, é um típico Pinot do velho mundo (de menor extração), com muita mineralidade, frutas e bom equilíbrio entre a acidez, taninos e corpo. Leve e agradável. Preço: R$63,00.

Domaine Perrin La Vieille Ferme (França) – Um vinho simples mas muito bem feito. Da região do Rhône, pode-se dizer que é aquele vinho “pau pra toda obra”. Fácil de beber, sozinho ou acompanhado por aperitivos ou uma refeição. Destaque para sabores de frutas vermelhas (morangos e cerejas) e especiarias doces (canela, funcho). Preço: R$65,00.

Bodegas Staphyle Gea Malbec 2010 – Argentino, da região de Lujan de Cuyo. Aromas discretos que crescem com tempo na taça ( frescor de mentol, eucalipto). Na boca mostrou-se denso, cheio de frutas, chocolate e notas animais (couro). Um típico Malbec dessa região. Preço: R$59,00.

Vinhos da crise

Canforrales Tempranillo Clássico 2013 – Espanhol, da região de La Mancha. Mostra bem a tipicidade da uva e da região: Nariz seco e amadeirado com final terroso e ervas aromáticas. Na boca mostra corpo médio, sabores bem integrados e equilibrados. Preço: R$ 51,00.

Hécula 2011 – Espanhol, da região de Yecla. Feito com a uva Monastrell que é típica do mediterrâneo, e na França é conhecida como Mouvèdre. Tem um caráter bem mineral que lembra carvão e brisa marinha. Com taninos fortes, foi o mais equilibrado de todos. Corpo frutoso e erva verde bem aromática. Preço: R$65,00.

Pérez Cruz Cabernet Sauvignon Reserva 2012 – Valle do Maipo, Chile. Bom corpo, frutado, correto. Apesar de ser elaborado por um bom produtor no Chile, foi o que menos agradou. Talvez pelo álcool evidente e a falta de tipicidade que lhe daria mais personalidade. Preço: R$66,00.

Uma questão que devemos sempre levar em consideração quando escolhemos um vinho, é saber quem o produz. Fazendo uma analogia à indústria automobilística, quando queremos comprar um carro e temos várias opções de fabricante, escolhemos um que por alguma razão nos dá a segurança de qualidade e entre seus produtos escolhemos um que esteja de acordo com a nossa necessidade e que podemos pagar, certo? Por exemplo: Se acredito que um “Volkswagen” é uma boa marca de carros posso escolher desde um Gol 1.0 até um Touareg 4×4 turbo. Ou se prefiro um “Ford” tenho a opção de um Fiesta 1.0 até um Ford Ranger Automático. Com vinhos não é muito diferente. Um bom produtor tem uma gama de vinhos que vai desde os mais simples, para o dia a dia até os tops de linha para ocasiões especiais ou mesmo para aqueles que podem comprá-los.

Uma das boas lições que se pode extrair de uma crise é que com criatividade e conhecimento de causa podemos adaptar as necessidades individuais ao respectivo bolso. Estar aberto a novas sugestões e mudanças é um sinal positivo que impulsiona o desenvolver da vida cotidiana. De resto, como já dizia o Superman: “Up, up & away!

Pelo andar da carroça já, já vamos montar uma de até R$50,00 e certamente vamos descobrir bons rótulos aí também, aliás já os tenho, o que só vem demonstrar que há bons vinhos nas mais diversas faixas de preço, só precisa garimpar com mais cuidado e são mais raros. Por outro lado, o tradicional é que aos confrades tomem no seu dia a dia, fim de semana ou momento de celebração, vinhos num patamar de preço algo mais baixo, então o exercício foi muito proveitoso. Aproveito para dar uma dica, prove e conheça os rótulos de entrada de um produtor. Se os vinhos forem bons, suba a escala numa boa pois o porto é seguro e nesse produtor fica certamente mais garantido o investimento em rótulos algo mais caros. Saúde e kanimambo!

Falando de Tempranillo

 

Falar de Tempranillo é falar de Espanha e da região da Rioja onde a maioria dos vinhos tintos são elaborados Tempranillo 1com esta cepa tanto em forma varietal como em cortes tradicionais com Garnacha, Graciano e Mazuelo. A origem de seu nome vem palavra espanhola temprano, que significa cedo, devido á precocidade de seu ciclo vegetativo em relação às outras variedades tintas da região. É uma uva de muitos nomes porém de um mesmo perfil independentemente de onde seja cultivada; Ull de Llebre (Catalunha); Cencibel (La Mancha); Tinto Fino ou Tinta del Pais (Ribera del Duero ), Tinta de Toro (Toro) todas na Espanha e ainda Tinta Roriz (Douro e Dão) e Aragonez (Alentejo) ambas em Portugal. Em geral, os vinhos de Tempranillo são elegantes, estruturados, ganhando grande complexidade quando passam por madeira tornando-se bastante longevos com ótima resistência à oxidação. Seu estilo fica entre os tintos de Bourgogne e Bordeaux. Podem apresentar aromas de frutas vermelhas, caramelo e especiarias, mas é mais marcante em boca onde realmente mostra a que veio!

Jovens Tempranillos, tendem a ser de corpo leve para médio, macios e amistosos devendo assim como os Pinots, serem servidos levemente refrescados, por voltas dos 15 a 16º quando melhor demonstram toda a sua sedução, alcançando a plenitude dos sentidos. Os vinhos de Ribera Del Duero, Toro e Douro (Roriz) tendem a ser mais encorpados com uma carga tânica maior precisando de mais tempo para se abrir e mostrar toda a sua exuberância ao palato. Hoje encontramos ótimos exemplares destes vinhos vindos da Espanha a preços cada vez mais camaradas, mas há de tudo; de 30 a mais de 1.000 Reais! Em 2013, duas das principais revistas americanas, Wine Spectator e Wine Enthusiast, tiveram no topo de seus TOP 100 do ano, dois Riojas Gran Reservas, uma mostra que esta uva pode produzir grandes e inesquecíveis vinhos. A Argentina, Uruguai e Brasil também são opções para se encontrar vinhos para prova, mas hoje me atenho a recomendar somente vinhos espanhóis de três regiões e diferentes faixas de preços que cabem no bolso!

DSC03739Canforrales Tempranillo – La Mancha
La Mancha não é das regiões produtoras espanholas de maior destaque, apesar de ser a maior, porém é de lá que vêm alguns dos melhores custos benefícios do mercado nos dias de hoje. Muitos vinhos nesta faixa abaixo de R$50,00 tendem a ser algo esqueléticos, ligeiros e sem qualquer estrutura, porém este rótulo é uma prova viva de que se pode tomar bons vinhos sem deixar um rombo no bolso no processo. Leve passagem por madeira (3 meses), taninos sedosos, boa estrutura, fruta fresca abundante (cereja bem presente), acidez presente e bem balanceada um ótimo gama de entrada para esta uva. Para acompanhar carnes grelhadas, queijo manchego, chorizo fatiado, até uma morcilla! Preço médio – R$49,00

Finca Nueva Crianza – Rioja
DSC03740Roja é minha região preferida quando o tema é tempranillo/Espanha e este rótulo mostra bem como esta saborosa e versátil uva se adapta bem à madeira. Em sendo um Crianza, já temos uma exigência mínima de 12 meses de barrica e mais 12 de cave antes de sua comercialização. Num patamar de preço intermediário, é um dos melhores e mais saborosos rótulos do mercado. Nariz marcante de frutos escuros e cereja com notas de baunilha, um toque de mocha e algo terroso. Boa estrutura, corpo médio, taninos bem equacionados, um vinho apetitoso e sedutor com um final algo especiado e longo mostrando toda a personalidade da uva. Preço médio – R$79,00

DSC03741Viña Sastre Crianza – Ribera del Duero
Grande produtor desta região, no sentido qualitativo, este é seu vinho de gama média entre os seis rótulos que disponibiliza. Passa 14 meses em barricas novas de carvalho francês e americano sendo elaborado com uvas de vinhedos entre 20 e 60 anos de idade. No palato uma riqueza de sabores ímpar, ótima textura e volume de boca denso, fruta madura, terroso, taninos aveludados de grande qualidade ainda presentes dando-lhe estrutura, boa acidez e um final longo com toques minerais que pede bis. Um belo vinho, bastante complexo, que prima pela harmonia, mas se quiser extrapolar e tiver bolso para tanto, vá do potente Pago Santa Cruz, i-na-cre-di-tá-vel!
Preço médio deste Crianza – R$ 140,00

É isso, bom fim de semana. Salute, kanimambo e seguimos nos encontrando por aqui. Ah, ia-me esquecendo! Ainda temos vagas para o Riedel Tasting – Degustação de Taças no dia 16, vem vai! Reservas para comercial@vinoesapore.com.br e pode ver mais clicando aqui > http://falandodevinhos.wordpress.com/2014/04/09/degustando-tacas-pode/

Festival de Tempranillos ou Não!

       Sou fã desta uva e adorei a ideia das Enoladies, confraria de mulheres, em se reunir para provar vinhos desta cepa das mais variadas regiões da Espanha. Para apimentar um pouco o painel, inclui um (pensei eu) único vinho que não era 100% Tempranillo e não as deixei ver os contra rótulos das garrafas, mesmo sabendo o vinho sendo servido. Exercício sensorial legal, descobrir qual era o vinho que tinha um tempero extra! Seis vinhos que vieram de; Rioja, La Mancha, Ribera del Duero, Pago de la Guardia (Toledo), Castilla y Leon (Sardon del Duero) e Toro. Para começar os “trabalhos”, já marca registrada de todas as degustações que promovo, um espumante para limpar o palato preparando-o para o que está por vir, e desta feita um delicioso Collin Cremant de Limoux (Languedoc) muito fresco e cremoso, mais um fruto do garimpo que faço por esta vinosfera e que vale cada tostão gasto.

Canforrales Selección  (La Mancha) – um vinho bem saboroso e equilibrado, taninos sedosos, redondo e pronto que foi bem solo porém com a chegada dos outros vinhos de outro patamar de qualidade se ressentiu. Pelo preço, no entanto, um vinho que cumpre seu papel com galhardia. Abaixo de R$70,00.

Sierra Cantabria Crianza (Rioja) – riojano em sua essência, amadeirado no ponto, aquela baunilha típica, complexo e rico, taninos sedosos que evoluem na taça muito bem, fruta madura, notas terrosas, finalizando com toques achocolatados. Um vinho sedutor, tradicional, que não nega as caracteristicas desta região de origem. Preço ao redor de R$110,00.

Rivola (Castilla y Leon) – a Abadia Retuerta é uma Bodega que produz grandes vinhos em Sardon del Duero e este é um vinho de gama de entrada que leva 40% de Cabernet que apareciam nas nuances vegetais, em especial a azeitona, muito bem integradas, cremoso na boca um vinho que encantou a maioria. Muito boa paleta olfativa que convida ao próximo gole. Preço ao redor dos R$95,00

Elias Mora Tinto (Toro) – este rótulo é uma de minhas últimas descobertas, um vinho que consegue unir força com elegância num conjunto rico que encanta ao primeiro gole, pois é na boca que ele se mostra em todo seu esplendor com notas de fruto negros e algum tostado. O final de boca encanta, longo, algo especiado e vibrante. Preço por volta dos R$98,00.

Martúe (Campos Pago de la Guardia) – um vinho de Pago na Espanha significa que estamos diante de uma região ou vinhedo  de excepcional qualidade (são somente 13 no país) e este vinho não nega a raça. Já o comentei aqui, mas a cada garrafa que abro mais me seduz, um vinho encorpado,  muita fruta madura, complexo, taninos firmes mas aveludados e aqui minhas desculpas publicas às Enoladies pois este vinho também não era 100% Tempranillo, onde eu estava com a cabeça?!!  É sim um blend que justifica a complexidade do vinho, em que a menor parte é Tempranillo, mas valeu de qualquer forma porque o vinho é da hora. Cabernet Sauvignon (33%), Merlot (22%), Tempranillo (21%), Petit Verdot (13%) y Syrah (11%), um vinho imperdível, na minha opinião a melhor relação custo x prazer deste painel de vinhos, que custa R$98,00. Esteve presente no Happy Wine Time da Vino & Sapore faz umas duas semanas e foi um enorme sucesso.

Uma Cepa (Ribera del Duero) – uma garrafa por planta, é essa a relação fruta x garrafa desse vinho. Um vinho marcante, de produção meticulosa que aparece na taça. Já vendeu por R$135 chegou a 170,00. Está num patamar acima dos outros vinhos, mas o objetivo desses encontros não é só didático, é também se dar bem e este vinho cumpre com honras esse intento, um vinhaço que encanta e, se achado em promoção, tem que comprar de caixa. Denso, muito saboroso, untuoso, ótima textura, especiarias, frutos negros, musculoso porém com um toque de elegância no final de boca, fazendo jus aos vinhos da região que tradicionalmente se mostram bem mais encorpados do que os de Rioja. Um grande vinho a ser conhecido e não foi à toa que foi considerado o melhor vinho do encontro seguido do Elias Mora e Martùe.

No todo, uma seleção muito boa e muito saborosa que seduziu a maioria que posteriormente se esbaldou com um belo pedaço de Chipaguaçu, um quitute da hora trazido pela Mariana, mas esse é papo para outro post. Por hoje é só. Salute, kanimambo e nos vemos por aí ou por aqui, quem sabe onde nossos caminhos nos levam!