Salvaguardas – o Mundo Questiona o Protecionismo do Brasil

        Tanto fizeram que conseguiram! Quando as razões não fazem sentido e não há justificativa plausível, o mundo é contra e só “elles” enclausurados em seus castelos ainda seguem recitando seus mantras!

1 – Deu no Estadão, um dos principais jornais paulistas e brasileiros.

Jamil Chade, correspondente de O Estado de S.Paulo

GENEBRA – Os maiores exportadores de vinho do mundo levam queixas às reuniões da Organização Mundial do Comércio (OMC) contra o Brasil, que anunciou recentemente estudar a imposição de salvaguardas contra o vinho importado. Produtores nacionais já indicaram que esperam que a medida seja válida por três anos.

Uma coalizão de países que inclui Chile, Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia e África do Sul, além de países europeus, cobrou respostas por parte do Brasil ontem, em Genebra, apelando para que as investigações realizadas no País estejam em conformidade com as leis internacionais e exigindo explicações sobre o motivo da medida protecionista.

Não se trata ainda de uma disputa nos tribunais da OMC, e não haverá, por enquanto, um processo judicial. Mas a decisão dessa série de governos de levar o assunto a um encontro na entidade serviu de recado ao governo brasileiro de que esses países vão defender seus interesses, inclusive nos fóruns internacionais.

Essa é a primeira vez, porém, que as críticas vêm tanto de países ricos quanto de outros emergentes. O Brasil anunciou a abertura de uma investigação para estabelecer salvaguardas contra vinhos de qualquer origem, exceto dos países do Mercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai).

Produtores nacionais não escondem que a meta da barreira é a de permitir que o setor nacional possa ganhar competitividade e a esperança é a de que sejam estabelecidas cotas. O que se quer evitar é que o crescente mercado consumidor de vinho nacional acabe dominado por marcas estrangeiras. Dados oficiais indicam que, em 2010, o Brasil importou 75,3 milhões de litros de vinho. Desse total, 26,5 milhões de litros vieram do Chile, ante 18 milhões da Argentina, 13 milhões da Itália e 8 milhões de Portugal.

Briga. Na sexta-feira, 27, não por acaso, os chilenos foram os maiores queixosos. Segundo a delegação de Santiago, suas exportações seriam as mais afetadas, lembrando que seus principais concorrentes – Argentina e Uruguai – ficarão isentos da barreira por serem parte do Mercosul.

A Europa também questionou o Brasil. Segundo a missão europeia, Bruxelas tem pelo menos quatro preocupações. A primeira é o fato de que apenas um tipo de vinho está sob investigação, e cobra explicações sobre o motivo pelo qual esse segmento foi escolhido. Bruxelas ainda alerta que não houve um aumento drástico na exportação de vinhos para o Brasil nos últimos dois anos, insinuando que não haveria motivo para a salvaguarda.
 
A UE ainda alertou que a presença do vinho estrangeiro no mercado nacional, mesmo que represente 80% do consumo, teria pouco impacto na produção nacional e não haveria sinais de prejuízos aos fabricantes brasileiros. Segundo os europeus, os produtores nacionais estão “desfrutando de altas vendas e lucros”.

A Europa ainda criticou o fato de a Argentina ter ficado isenta da barreira, apesar de ser um dos principais exportadores de vinhos ao Brasil.

A União Europeia já havia manifestado ao Brasil preocupação em relação à atitude. O comissário de Agricultura europeu, Dacian Ciolos, enviou uma carta às autoridades brasileiras no dia 15 de março, justamente alertando que a barreira não seria justificável. Na Europa, produtores vêm enfrentando uma concorrência cada vez mais acirrada do vinho do “Novo Mundo”, e o fechamento do mercado brasileiro seria mais um golpe.
Ontem, na OMC, o governo americano também alertou ao Brasil que está “monitorando o caso” e diz “compartilhar as preocupações” de outros exportadores.

O governo brasileiro, como vem adotando em outras disputas, afirmou que está convidando as delegações de Austrália, Chile, África do Sul e Estados Unidos a participar de consultas bilaterais e investigações em curso no Brasil.”

2 – Conforme comunicação recebida do Carlos Arruda, Academia do Vinho, o Comité de la Communauté économique européenne des Industries et du Commerce des Vins, Vins aromatisés, Vins mousseux, Vins de Liqueur et autres Produits de la Vigne (CEEV) já apresentou um requerimento solicitando o arquivamento do processo de Salvaguardas como peticionado pela Ibravin, Uvibra e Cia, patrocinados pelos grandes produtores de vinho brasileiro. Já tinha aqui comentado de que tecnicamente essas Salvaguardas não passam por falta total de embasamento e da premissa básica essencial aos processos desta natureza, “prejuízo grave ou risco de” baseado em dados públicos divulgados nos próprios sites desses produtores assim como por seus assessores de imprensa. A CEEV no entanto, com todo o seu expertise, vai bem mais fundo e faz uma análise detalhada e muito bem construída que vem demonstrar a falácia apresentada pelos peticionários ao Ministério e que os levou a uma primeira análise equivocada. Vale muito a pena acessar este link ( http://www.academiadovinho.com.br/fotos/Manifestacao_CEEV.pdf) e ler as muitas páginas que compõem esse requerimento, mas duas coisas me chamaram a atenção:

  • A alegação das Peticionárias de que a redução do consumo na europa iniciou inesperadamente em “meados de 2009” é simplesmente falsa. É fato que o consumo de vinho na Europa segue uma tendência decrescente há diversos anos. Essa tendência decrescente no consumo de vinho europeu é devida a questões estruturais. Os consumidores europeus alteraram, durante um período de 20 a 30 anos, os seus padrões de consumo: passaram a consumir vinhos de qualidade mais alta e de forma mais moderada e responsável. O consumo de vinho na Europa reduziu em 15 milhões de hectolitros nos últimos 20 anos, com um decréscimo de mais de 20% nos países que são tradicionais produtores (França, Itália, Espanha e Portugal) desde 1996. Essa tendência estrutural se manteve estável por diversos anos, conforme demonstrado na tabela do Anexo 1. O impacto da crise econômica (sentido com maior força em 2008 e 2009) é dificilmente visível nos dados de consumo. Consequentemente, a redução do consumo de vinho na Europa não pode ser descrita, conforme alegam as Peticionárias, como “evolução imprevista das circunstâncias”. Trata-se de um fenômeno conhecido, que foi desenvolvido durante diversos anos e é desconexo com a recente crise econômica. A redução do consumo europeu de vinho é uma tendência estrutural que é completamente desconexa da crise econômica e financeira de 2008/2009.
  • O padrão estabelecido pelo Órgão de Apelação da OMC requer os seguintes fatores: “É necessário que as autoridades analisem importações recentes, e não simplesmente as tendências durante os últimos cinco anos – ou, para essa finalidade, durante qualquer outro período de diversos anos.  De fato, os dados apresentados pela Circular são imprecisos, pois se baseiam em um período de 5 anos, de 2006 a 2010, e não contém dados recentes (2011 e o início de 2012). Isso afeta a relevância das provas apresentadas e está em discrepância com os requisitos estabelecidos pelo Órgão de Apelação da OMC. De fato, as estatísticas disponíveis de 2011 demonstram que não houve aumento nas importações de vinhos classificados no código 22.04.21.00 (aumento de 3% em comparação a 2010).

De qualquer modo, os dados apresentados na Circular (até 2010) demonstram uma tendência estável no aumento de importações de vinhos finos no Brasil, ao invés de um surto “repentino, recente e acentuado”, conforme exigido pela jurisprudência da OMC. A única aceleração genuína de importações de vinho fino pode ser notada em 2010. Isso pode ser explicado pelo fato de que as autoridades brasileiras introduziram uma nova regulação fiscal (selo de controle) no referido ano. De modo a evitar esse custo adicional, importadores reorganizaram a cadeia de fornecimento para importar vinhos antes da entrada em vigor da referida medida., coisa que começa a repetir neste inicio de 2012 com as ameaças de estabelecimento de eventuais salvaguardas. Esse evento específico inflou artificialmente o nível de importações em 2010, mas os dados de 2011 demonstram que o aumento nas importações notado em 2010 não foi contínuo. O Anexo 4 contém artigos confirmando os efeitos da imposição da medida supracitada pelo governo brasileiro em 2010, dentre os quais há um comunicado de imprensa do próprio IBRAVIN reconhecendo que as importações voltaram a se estabilizar em 2011 após o impacto da nova regulação fiscal ser absorvido pelo mercado.

Em suma, os fatos apontam claramente que:

  • Nenhuma “evolução imprevista das circunstâncias” pode ser comprovada, que possa ter resultado em um aumento de importações de vinhos finos no Brasil.
  • O aumento de importações do produto investigado não é recente, repentino ou acentuado, conforme requerido pelas normas e jurisprudência da OMC.

 O caldo está engrossando! No geral, quanto mais vejo o que os peticionários escreveram e o que falam, mais me lembro de uma frase que li um dia em algum lugar, de que “estatistica é a arte de torturar os números até que alcancem o resultado desejado”! 

Salute e kanimamb0.