Uncle Scrooge e os Preço dos Vinhos

                 Há poucos dias, me disseram que, ao escrever neste blog, passo a impressão de que sou um pão-duro, munheca, sovina, muquirana, um “Uncle Scrooge” do vinho. Quem me conhece sabe que sou tudo menos isso, aliás, chego a ser um pouco, até já fui mais quando o bolso assim o permitia, perdulário. O que sempre me incomodou na vida foi de jogar dinheiro fora. Não me incomodo de gastar, dentro dos meus limites, mas incomoda-me sentir roubado e ser feito de trouxa. Não receber pelo preço, qualquer que seja, o justo valor do que paguei, é uma coisa que me irrita.  Quero receber o justo prazer pelo que paguei. Se pago um café R$5,00 e não estou em Veneza, Milão ou Paris, então espero que seja um BAITA café e que o serviço seja à altura do que desembolsei. É o tal negócio, algo pode custar muito dinheiro e não ser caro. Por outro lado, podemos pagar uma ninharia por alguma coisa, e este preço vir a ser extremamente caro.  Aliás, há coisas que, de graça, são caras! Há quem possa, e não se incomoda, pagar absurdos por uma garrafa de vinho ou um jantar num dos melhores restaurantes, nada contra, muito pelo contrário se isto lhe der prazer ou lhe for importante do ponto devista de status. Cada um sabe de si, e não existe aqui nenhuma forma de patrulhamento, muito pelo contrário. Cada um faz o que quiser com o dinheiro que honestamente ganhou e que, de certo, suou e sacrificou muito para ter e chegar a essa situação privilegiada, só não vale cartão Corporativo do Governo, aí já é sacanagem. Só que, este blog, não trabalha em função dessa minoria e sim da grande maioria dos consumidores, é outro projeto e outro conceito. Quero vinho bom por preço bom e, há espaço para isso, basta querer rever estratégias. Melhores Vinhos por Melhores Preços, essa é a filosofia.

              Todavia, quando se tem conhecimento de custos e preços internacionais, se tem oportunidade de viajar, quando se estuda e se lê bastante, quando se navega pelas diversas lojas on-line disponíveis por esse mundo afora, as comparações se tornam inevitáveis. Nosso nível de exigência, cresce na mesma proporção que o nosso conhecimento. Por exemplo, ao fazer um trabalho sobre Espumantes, verifiquei que um deles custava em 2001, cerca de USD32. Hoje, ele custa cerca de USD 75 (já com a nova taxa do Dólar, porque antes era 98)! Não tem nada que justifique isso e, certamente, o produtor pouco vê desse aumento absurdo. Quando vou a um restaurante, peço a carta de vinhos e verifico que o proprietário dobrou o preço (de empório ou loja), isto quando não ultrapassa este fator, me sinto roubado e perco o apetite. Daí a importância de restautantes Amigos do Vinho como o Villa, que trabalham com margens honestas nos possibilitando momentos de prazer enogastronômicos sem perigo de rombos enormes no bolso. Sei que estes estabelecimentos compram com desconto e, nenhum serviço, pode justificar tamanha diferença de preço. Obviamente que, nesse tipo de lugar, dificilmente volto a colocar os pés.

              Ainda existe no Brasil, um ranço antigo, de que o negócio é ganhar muito em cima de poucos quando, em economias mais avançadas, há muito já se entendeu de que o segredo da longevidade e saúde empresarial é exatamente o inverso e isso vale para os impostos também! Muitos já mudaram, como boa parte dos lojistas que são a parte frágil da equação, mas existem segmentos da economia que resistem ao tempo e ao bom senso. Por isso seguimos tendo um consumo de vinho per capita tão baixo. Não é só por razões culturais e climáticas não, a razão econômica e o coeficiente qualidade X preço, são fatores preponderantes a serem considerados, mesmo, ou talvez até mais, quando de vinhos nacionais! Agora, enquanto houver quem paga sem pestanejar ……

               Melhor mesmo, é quando me surpreendo. Quando recebo em troca do valor pago, e, repito, qualquer que seja o montante, mais prazer do que esse valor pago. Aí, me sinto ganhador e, em sendo uma ótima sensação, vou querer mais, sempre! Como profissional de mercado (comercial & marketing) que sou, acredito, piamente, que a longevidade de qualquer empreendimento se baseia na troca justa, no famoso ganha x ganha. Seja na qualidade do produto, na simpatia e eficiência do serviço, no aconchego do local, tudo deve se conjugar para nos trazer, neste caso,  o prazer da mesa, o prazer do vinho, o prazer da vida!

             Pão durisse? Sou bastante autocritico e penso que não. De qualquer forma, o mundo não se molda às minhas necessidades e minhas crenças. Tem que existir de tudo para todos e, o que busco, é achar os produtos e locais de justo retorno que atendam minha necessidade e compartilhar isso com os amigos. Se existe gente que se sente incomodado, paciência, eu também não me sinto à vontade de saber que um determinado vinho custa Euros 18 na Europa e, aqui, custa seis vezes mais, quando o razoável, baseado na nossa estrutura de impostos e cadeia de distribuição e comercialização, seriam umas três vezes nos vinhos de menor valor e de duas a duas e meia nos vinhos de valor mais alto! Não me sinto à vontade sabendo que um vinho é vendido por R$30,00 na maioria dos locais e, em determinado supermercado custa R$48,00, que o vinho na prateleira custa R$37 e o restaurante me pede R$76,00 e, por ai vai.  Ainda mais quando alguns importadores já se valendo da valorização do Dólar e com bastante gordura para queimar, saem dando aumentos que, pasmem, chegam a incríveis 25%! Com tudo o que já tivemos de aumento este ano, ainda mais esta?! Desculpem, preciso desabafar, mas depois não entendem porque o consumo não evolui e/ou os estoques estão altos!!! 

           Posso pagar? Talvez possa, não vem ao caso, mas não pagarei, afora por uma ou outra eventual, muito eventual, estripulia! De minha parte só comprarei daqueles que não aumentaram e, mais do que nunca, vou garimpar e separar o joio do trigo. Existem aqueles que baixaram preços quando o Real se valorizou, existem aqueles que trabalhavam com margens enxutas e preços baixos e nesses casos se entende eventuais alterações.  De resto mon ami, é hora de botar as barbas de molho e refletir sem entrar em furadas lembrando que o apressado come cru.

Salute e kanimambo.

“Os homens são como os vinhos. A idade azeda os maus e apura os bons”.

Marcus Cícero – Filósofo, orador e escritor Romano.