Diversidade Italiana num Encontro Divino com 12 Mulheres

Um grupo de amigas se encontra mensalmente para explorar os sabores do vinho e descobrir os segredos de deus Baco! Tenho a honra de ter sido escolhido por elas, sim porque a escolha é sempre delas, como seu guia nessa viagem e, desta feita, incansáveis em sua sede de saber,  após seis, ainda pediram mais e terminamos com o soberbo Amarone Ca del Pipa Cinque Stelle acompanhado de lascas de Gran Mestri, um queijo tipo Grana Padano de muita qualidade produzido em Santa Catarina. Passeamos virtualmente por parte da Itália, deixando a outra parte para uma segunda viagem, mostrando toda a diversidade e grandeza dos vinhos italianos.

       Iniciamos pelo Veneto nos deliciando com um fresco e muito bom Prosecco Incontri elaborado por uma mulher de talento, a Piera Martelozzo, e nos esbaldamos com o Costamaran Valpolicella Superiore Ripasso que é um tremendo vinho, complexo e encantandor mostrando que a região de Valpolicella tem diversas vertentes, entre elas a de grande qualidade como os vinhos deste produtor (Castellani); na Puglia provamos o Prima Mano, um belo exemplo de um primitivo muito estruturado e saboroso; passamos por Abruzzo e vimos que a colina Terramane, unico DOCG da região, pode produzir vinhos inesquecíveis e o Notari Montepulciano d’Abruzzo é um claro exemplo disso com sua cor intensa, denso, untuoso e quase mastigável, taninos finos e muita fruta no nariz;  terminando esta primeira etapa da viagem na magnifica Piemonte onde provamos um delicado Michelle Chiarlo Barbera d’Asti Superior Le Orme pleno de sutilezas e o valente Tre Ciabot um Barolo de La Morra produzido pela Cascina Ballerin, vinhos de muita qualidade e extremamente gastronomicos que imploravam por comida.

            Mas este seleto grupo de mulheres se mostrou insáciável neste encontro não resistindo a um vinho de pura reflexão, o divino Ca del Pipa Cinque Stelle um belissímo exemplo de Amarone muito balanceado em seus 15.5% de teor alcóolico, complexidade na boca com um final longo, daqueles vinhos que, na duvida entre se fungarem ou se beberem, são para ser lambidos em puro extâse, um vinho soberbo e inesquecível que marcou este encontro marcante com Baco e suas tentações!

          A grande maioria elegeu o Amarone como o grande vinho da noite (pudera!), mas a prova como um todo foi de um nível de qualidade muito bom e marcante, cada vinho com seu jeito e sua personalidade. Impressionou muito o Costamaran Valpolicella Ripasso, que passa por barricas usadas de Amarone, em função do preço e do fato de que pouco se esperava de um Valpolicella, marca regional amplamente degradada pelos fiascos de palhinha de outrora!

        Feliz por ter podido usufruir e contribuir com este encontro, fico-me perguntando como superar esta experiência em nosso próximo? Certamente um trabalho que vai demandar mais criatividade e serenidade na escolha de novos caldos e, esperamos, alguns néctares que desfrutaremos na continuação desta viagem pela Itália.

        Arriverdeci,  grazzie e una buona giornata per tutti.

Barolo II

Dando seqüência ao post de ontem sobre Barolos, a Expand convidou-me para uma degustação de quatro vinhos de diferentes vinhedos e terroirs, do produtor Batasiolo. Esta casa produz algo em torno de 4 milhões de garrafas de vinho anuais, das quais cerca de 300.000 são de Barolo. Em cerca de 50 hectares plantados com nebbiolo para a produção de barolo, a Batasiolo produz vinhos somente com uvas próprias o que lhe dá um maior controle sobre todas as etapas de elaboração do vinho, em especial das vinhas onde o vinho é efetivamente construído. São quatro vinhedos denominados crus, cada qual com seu terroir muito próprio gerando vinhos da mesma “linhagem” porém com características diferentes entre si, mesmo que muito próximos um dos outros. São quatro esses crus, que compõem a “Beni di Batasiolo”, ou os Bens da Batasiolo, numa tradução bem ao pé da letra; o Bofani junto aos municípios de Monforte d’Alba e Barolo, o Boscareto em Serralunga d’Alba, Cerequio em La Morra e o Corda della Briccolina, também no município de Serralunga d’Alba. Quatro vinhos provados com diferenças entre eles, que tentarei compartilhar com os amigos;

Barolo Cerequio 2001, o mais pronto e um dos que mais me agradou, talvez em função disso mesmo. Não é por estar pronto a tomar que não deve ainda evoluir por mais uns cinco ou seis anos, certamente o fará, mas já está delicioso com taninos aveludados e com muita elegância. De boa estrutura,  aromas de boa intensidade, vivos em que aparecem fruta do bosque com nuances de menta e algum floral. Na boca está muito saboroso, rico, franco e equilibrado com boa acidez que lhe dá um frescor muito agradável, e um delicioso final de boca de boa persistência. De todos, foi o que me pareceu mais frutado, porém sem os exageros novo mundistas, tendo realmente me encantado. Um barolo, talvez mais leve e mais moderno, muito saboroso e agradável de tomar

Barolo Bofani 2001, um pouco mais fechado e contido do que o Cerequio, mas o segundo mais pronto a tomar. Os taninos estão um pouco mais marcantes pedindo um decanter por cerca de uma hora quando devem se acomodar. Senti nos aromas algo diferente, talvez um pouco balsâmico, algo herbáceo. Na boca mostrou menos complexidade de sabores, mas tem uma entrada de boca muito agradável e equilibrada, apesar de não apresentar o mesmo frescor do Cerequio. Taninos finos e refinados, boa estrutura, bastante longo, um senhor vinho que precisa de um pouco mais de tempo

Barolo Boscareto 2001, de todos o mais fechado com taninos ainda muito firmes e adstringentes. No nariz apresenta uma fruta em passa que se comprova na boca de forma viril mostrando bastante potência, boa acidez, algo de especiarias e longa capacidade de guarda. Se existe um infantícidio no mundo dos vinhos, cometemos um com este. Sem duvida alguma um vinho para se tomar daqui a mais uma meia dúzia de anos quando se poderá usufruir de toda a sua exuberância. É comprar e guardar.

Barolo Corda Della Briccolina 2003, para o meu gosto, o meu vinho da degustação. Certamente está novo, mas já é adorável e sedutor com um nariz muito agradável de frutas dos bosque madura. Este é o único que passa por barricas de carvalho francês de 225 litros para estagiar o vinho antes do engarrafamento. Todos os outros passam pelos tradicionais tonéis de carvalho esloveno de 5 a 6000 litros como nas fotos. Está ainda um pouco duro, mas ao deixá-lo no decanter por cerca de 45 minutos (levei um resto para casa) abriu maravilhosamente. O que mais me surpreendeu nele foi uma certa mineralidade que, em conjunto com a ótima acidez e harmonia, lhe dá um enorme frescor. Na boca é encantador, fino, elegante com taninos doces e aveludados, muito harmônico com sabores meio tostados, algo de especiarias bem sutis e uma tremenda persistência com um agradável retrogosto que faz lembrar café. Um vinho sedutor e muito saboroso que já se aprecia muito bem hoje e certamente evoluirá mais ainda dentro de uns três ou quatro anos. Não me parece que tenha a mesma estrutura e potencial de guarda do Boscareto, mas como quero é tomar o vinho e não guardá-lo, creio que seus cinco ou seis anos de vida estão de bom tamanho! Se qualquer forma, se pudesse compraria duas, uma para tomar por agora e outra em uns dois anos quando, creio, estará à perfeição!

O Cerequio me encantou e o Briccolina me conquistou. Todos ótimos vinhos, mas para o meu paladar, estes são os dois vinhos que eu colocaria na minha adega. Os preços variam muito pouco, entre R$280 a 300,00 então a escolha não passa por aí. Será uma questão de preferência de estilo que, para mim, ficou muito claro. O que também fica claro, é que são vinhos realmente de guarda que não devem ser tomados com menos de uns cinco anos e, por uma questão de preços, são para poucos, assim como os bons Barbarescos também elaborados com 100% de Nebbiolo, só que em outra região do Piemonte e com outras características.

Salute e kanimambo

Barolo I

De uma das principais regiões produtoras Italianas, o Piemonte (norte da Itália), vem este que, junto com o Brunello de Montalcino da Toscana, é um dos grandes ícones de nossa vinosfera. Definido pelos Piemonteses como o rei dos vinhos e vinho dos reis, é elaborado com a uva Nebbiolo cultivada em vinhedos de uma restrita área de colinas que se estende por 11 vilarejos da província de Cuneo, entre elas Barolo, Serralunga d’Alba e La Morra (clique no mapa para ver região). Pelo caráter peculiar de vinho, pela área restrita de vinhas, e diversidade de terroirs, é um vinho caro tendo por característica o fato de serem vinhos concentrados, robustos, austeros que necessitam de tempo de envelhecimento e aeração para serem devidamente apreciados. Pela legislação da DOC (Denominazione di Origine Controllata), o Barolo envelhece por pelo menos três anos, sendo dois em tonéis de madeira, sendo que muitas casas produtoras ainda o deixam por um a dois anos em caves após engarrafamento.

Com abundancia de taninos potentes, típicos da uva nebbiolo, é um vinho com características duras, muita estrutura e de enorme complexidade devendo sempre acompanhar uma refeição com peso idem, em especial pratos de carne. Até pouco tempo atrás, um excelente Barolo necessitava de uns dez anos de guarda e decantação por seis, dez, até 24 horas para que toda a sua exuberância pudesse ser devidamente mostrada e apreciada.  Hoje em dia isto ocorre com cada vez menos assiduidade já que grande parte dos produtores modernizaram sua forma de produzir o vinho com novas técnicas de vinificação, introduzidas na região a partir dos anos 80, gerando vinhos mais amenos e prontos para tomar mais cedo. Hoje em dia a produção se divide entre produtores mas clássicos e tradicionais, e aqueles de estilo mais moderno. Cada um a seu estilo, mas certamente ambos produzindo excelentes vinhos. Em qualquer dos casos, vinhos que requerem paciência com, pelo menos, uns cinco a seis anos de guarda quando começarão a mostrar toda a sua exuberância aromática e complexidade de sabores.

Nestes últimos sessenta dias, tive oportunidade de provar uma meia dúzia de rótulos e iniciar meu aprendizado nos vinhos Piemonteses, em especial o Barolo. Primeiramente dizer que me ficou muito clara as diferenças nos vinhos causado pelos diferentes terroirs, segundo, que me encantei pela complexidade descoberta. Dizem não ser um vinho fácil que requer alguma litragem para ser melhor entendido, mas tenho que reconhecer que não me foi difícil entendê-lo só lamentando não ter podido acompanhar estes vinhos com um prato que lhes fizesse jus. Pelo que li, é parceiro ideal para carne assada, um ensopado, carnes grelhadas e por aí afora. Pessoalmente, penso que talvez um ensopado de carne com batatas, deve ser a perfeição e aí, penso naquele Javali na Pucura com Castanhas que comi no 1715 em Ribeira da Venda em Portugal, e BINGO!!! De qualquer forma, já me encantei assim mesmo com estes vinho tomados solos num estilo mais moderno, mais prontos para beber.

No Decanter Wine Show, tive oportunidade de provar os vinhos de Pio Cesare um dos principais e antigos produtores e negociantes da região do Piemonte. Entre os vinhos provados, o Barolo Ornato 03, criação top do produtor e, efetivamente, um grande vinho. Ainda austero fechado, teria se beneficiado muito de uma decantação de algumas horas, mas já mostrou uma ótima paleta aromática muito frutado com algumas nuances florais que não consegui identificar. Na boca é denso, carnoso, untuoso, taninos ainda firmes porém sem qualquer agressividade, complexo sabor de frutas maduras com algo terrososo e alguma presença de especiarias, terminando em um longo final de boca em que aparecem elegantes toques de baunilha. Uma criança que necessita de mais tempo, devendo crescer muito ainda nos próximos quatro a cinco anos adquirindo maciez e elegância. Na Decanter por R$413,50.

Do mesmo produtor, o Barolo 03, um “básico” da região. De grande intensidade aromática, perfumado, na boca é cheio, encorpado, taninos finos e macios, bem equilibrado, final de boca muito agradável com um retrogosto que me lembrou especiarias. Não tem a mesma complexidade do Ornato e é um vinho um pouco mais pronto a tomar apesar de que se beneficiará muito com mais uns dois anos de garrafa. Na Decanter por R$310,50.

Amanhã veremos a seqüência dos Barolos provados. Como disse no inicio, não são muitos, mas são vinhos que me fizeram mudar alguns conceitos ou, talvez, preconceitos para com os vinhos Italianos em geral. Aliás, estes vinhos não foram os únicos, pois diversos outros rótulos mexeram com minhas emoções. Tudo isto veremos ao longo do mês.

Salute e Kanimambo.